sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

Igreja do RS em clima de Romaria da Terra

Intensifica-se a preparação para a 37ª Romaria da Terra, que acontecerá no assentamento Lagoa do Junto, em Tapes, no dia 4 de março, feriado de carnaval. É organizada pela Comissão Pastoral da Terra (CPT/RS), pelo Regional Sul 3 da CNBB, pela diocese sede (neste ano Porto Alegre), com a colaboração de outras igrejas cristãs, movimentos sociais, sindicatos e organismos próximos ao local da romaria. Esta edição tem a temática voltada para a reforma agrária, cooperação e agroecologia. O lema escolhido convida a “Cultivar Vida Saudável”.
Nas palavras do Frei Wilson Dallagnol[1] percebe-se que a “Romaria da Terra não é uma romaria qualquer. É um espaço que unifica fé (mística) e luta do povo (política) na busca de uma convivência menos conflitiva e mais pacífica. As Romarias dão força aos pequenos da terra reunindo os excluídos da sociedade e até da Igreja. Nelas, os pobres da terra podem dizer o que sentem, em sua própria linguagem. Não são palavras vazias. São expressões de vida, de caminhada penitencial, expressão do sentimento comum que perpassa a todos os que sonham com uma nova sociedade, começando pela reforma agrária, por uma convivência igualitária entre homens e mulheres e respeito aos direitos humanos”
Como cristãos não podemos aceitar que uns tenham muito, outros pouco e uma boa parte nada, sabendo que a Terra é dom de Deus e pertence a todos. Não é nada cristão calar-se diante da concentração fundiária do Brasil que se mantem hoje nos mesmos níveis que 1986[2]. Em artigo sobre a democratização do acesso a terra Fernando Prioste[3] e Tchenna Maso[4] alertam que 1% dos proprietários controla 45% das terras cultiváveis no país. Têm-se até aqui, bons e justos motivos, para a Reforma Agrária popular.
Percebemos nas primeiras comunidades cristãs o espírito fraterno de partilha dos bens onde tudo era posto em comum. Como ficou difícil falar em cooperação num sistema que prima pelo individualismo, pela competição e pelo acumulo de bens. Nesse sentido a Romaria vem mostrar o espaço de vida, trabalho e produção nos assentamentos da reforma agrária, caracterizados pela cooperação, cuidado com a natureza, com a permanecia dos jovens no campo e na luta por justiça social.
Dentro da temática ainda destaca-se o esforço para a produção agroecológica, garantindo a vida e a biodiversidade, alimentos saudáveis e novas alternativas para enfrentar o uso massivo de agrotóxicos. Existe uma luta laboriosa para que o governo faça uma opção verdadeira pela agricultura familiar, que sofre com a pressão esmagadora do agronegócio, garantindo melhores condições aos produtores rurais. Pesquisas recentes mostraram que 70% dos alimentos que vão à mesa dos brasileiros (as) são oriundos da agricultura familiar. E nós como igreja como agimos diante do triste dado de que 30% das propriedades gaúchas não possuem sucessão? A final, qual é nossa preocupação com a evangelização na roça? Mais ainda como estão nossas ações para incluir os jovens do campo na igreja?
Todas essas são questões levantadas pelo espírito e compromisso da Romaria da Terra. São muitos os que lutam pela terra, camponeses, indígenas, quilombolas... e o evangelho deve nos levar a um compromisso ético com estas realidades. Como seminaristas rumo ao presbiterado não podemos esquecer-nos da luta por maior justiça social. O papa Francisco nos pede uma igreja em saída, pobre com os pobres, pastores com cheiro de ovelha. Pastores com cheiro do povo que sofre excluído pelo agronegócio, pelos interesses das multinacionais, pelo espírito competitivo que visa superar o outro.
Vamos juntos fazer essa caminhada peregrina, em busca da terra prometida (justiça, igualdade, fraternidade, partilha, diálogo, reforma agrária, agroecologia) em vista do Reino de Deus. Dom Spengler nos diz que “como homens e mulheres que se sentem iluminados, sustentados e amparados pela experiência da fé, como seguidores de Jesus Cristo, desejamos celebrar a vitalidade da mãe terra. Em comunhão com todos os homens e mulheres de boa vontade queremos participar desta grande celebração da fé, caridade e esperança. Vamos participar deste momento singular da caminhada da Igreja no Rio Grande do Sul. Sonhamos certamente com uma Terra verdadeiramente sem males” (Voz Da Terra, novembro de 2013).
                                                                                             Junior Centenaro[1]


[1] Seminarista da Arquidiocese de Passo Fundo. Acadêmico do quinto semestre de Filosofia no IFIBE.



[1] DALLAGNOL, Wilson. As Romarias da Terra no Rio Grande do Sul. 2 ed. Porto Alegre: Evangraf, 2009. p. 16
[2] Dado do Ministério do Desenvolvimento Agrário.
[3] Assessor jurídico da Organização de direitos humanos Terra de Direitos.
[4] Graduada em direito pela Universidade Federal do Paraná.

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