Esta pergunta moveu vários jovens
ligados a centros acadêmicos, pastorais e movimentos sociais. Fazer a memória
das vítimas em primeiro lugar é “descomemorar” aquilo que ainda é comemorado
por muitos, o golpe civil-militar de 1964 no Brasil. Como é importante sentir a
força dessa juventude que se manifesta dizendo: “Ditadura Nunca Mais, Resistência
Sempre”!
Engana-se quem pensa que a ditadura foi
algo distante, ou talvez que não tenha ocorrido perseguição no Brasil nesse
período. Nesse viés de “descomemorar”, postura crítica, vem a questão fundante
da memória. E foi isso que a juventude reunida na praça do Teixeirinha em Passo
Fundo realizou na passagem de 31 de março para 01 de abril, justamente a data
do golpe que derrubou o governo João Goulart. Fazer a memória das vítimas e dos
fatos, ligados a ditadura militar, juntamente com a história sangrenta a partir
da colonização europeia que destruiu a vitalidade e a esperança ameríndia e
africana é lutar por justiça. Isto nos motiva o Ofício dos Mártires da
Caminhada Latino Americana. Sem memória não há justiça.
Esses jovens tomaram o lado dos
vencidos, como diria Walter Benjamin, contra as fantasias que se criam de uma
história romântica, com condes, duquesas, imperados, reis e rainhas. Assumiram
a árdua tarefa de retomar a dor. Dor da morte, da tortura, do exílio, do sumiço
inesperado. Passar a noite em vigília tornou-se símbolo de atenção, para que
nuca se repita a brutalidade e a barbárie de um regime autoritário. Os jovens
reunidos em torno da cruz, do fogo, das bandeiras de luta e das imagens de 15
vítimas rezaram, memoraram, cantaram e celebraram a páscoa daqueles (as) que
entregaram suas vidas a exemplo do mártir Jesus, pela justiça, pelos pobres,
pelos sem terra, sem teto, pelos estudantes símbolo da resistência contra a
opressão militar.
Impossível esquecer o testemunho de frei
Tito de Alencar, Vladimir Herzog, Margarida Alves, Roseli Nunes e muitos outros
irmãos e irmãs nossas. Esquecer de fazer memória é tornar-se idiota. Idiota, do
grego, é aquele que não percebe, que permanece indiferente. Portanto engana-se
novamente quem pensa que política é coisa para idiota, pois é um legítimo
preocupar-se com a vida pública, com o outro. A política possibilita a
transformação social, portanto nada de idiota.
Além da vigília outras atividades
integraram a “descomemoração” do golpe e do regime que durou mais de 20 anos,
entre elas, exposições, debates com perseguidos, presos e torturados, como
também um ato público denunciando os crimes cometidos em Passo Fundo. Houve
também manifestação da câmara de vereadores e reflexão sobre os perseguidos
políticos da atualidade. Quando falamos que ainda existem perseguidos políticos
encontramos elementos para responder a pergunta sobre o por que fazer memória
as vítimas.
Por isso, não vamos ser idiotas
(indiferentes) e deixar que essas vítimas sejam trancadas no baú do
esquecimento. Não esqueçamos que devemos aos torturados e perseguidos, devemos
aos que morreram e desapareceram, devemos às famílias e a todos os brasileiros.
Jamais permitir que a amnésia domine. Assumir as lutas das vítimas, eis a
grande missão!
Liliane Ferenci
Junior Centenaro